APRESENTAÇÃO


ARTUR LAGE, SÓ O NOME É TUDO!

Em 27 de Novembro de 2011, se estivesse entre nós, faria 100 anos de vida.

Referimo-nos ao lendário Comandante Artur Lage, que a par de uma exemplar e invulgar carreira de Bombeiro Voluntário, liderou, durante 35 anos, de modo não menos marcante, o Comando dos Bombeiros Voluntários de Agualva-Cacém. Chegou, inclusive, a ser o comandante de bombeiros mais antigo do país, no activo.

Trata-se de uma figura cujos predicados de humanitarismo e solidariedade são dignos de relevo e justificam que a tomemos como referência no Dia do Bombeiro Português, efeméride celebrada, hoje, 29 de Maio, a qual, na esfera de FOGO & HISTÓRIA, serve de pretexto para o lançamento do presente sítio de homenagem.

Como acontece com todos os grandes vultos da história, a memória que se guarda do Comandante Artur Lage não tem limites, ou seja, não se confina a um só domínio e muito menos detém qualquer estatuto de exclusividade, nomeadamente no que respeita ao acto de evocar. Como individualidade pública que foi, e por fazer parte do valioso património moral e cultural dos bombeiros portugueses, evocar a memória do Comandante Artur Lage constitui um imperativo de consciência cívica e cidadania responsável.

Escreveu, um dia, o também saudoso Engenheiro Branco Lopes, ex-Vogal da Direcção do Serviço Nacional de Bombeiros, outra figura incontornável merecedora do maior apreço, que "a memória dos homens é curta. Mas, quando a Obra perdura para além das limitações humanas, as mentes são obrigadas a ceder à força dessa que a acompanhou".

Por se rever em tal afirmação, e fazendo jus ao seu perfil, FOGO & HISTÓRIA decidiu evocar o centenário do nascimento do Comandante Artur Lage, reservando-lhe um espaço próprio, subintitulado "100 Anos, 100 Factos", que será mantido ao longo dos próximos meses e, posteriormente, estará disponível como documento de consulta e, desse modo, ainda, para a posteridade.

Esta é a nossa homenagem a um homem com H grande que tivemos o privilégio de conhecer de perto e, por isso mesmo, entendemos, sem prejuízo de outros, estar num plano favorecido para falarmos sobre ele.

Para além de, no passado, termos assinado, em co-autoria um livro sobre a vida e obra do Comandante Artur Lage, o que implicou a entrega ao estudo, muitos anos antes, chegámos a acompanhá-lo, aquando da deflagração de incêndios, sendo por isso testemunhas oculares da sua admirável acção quer em termos técnicos, quer na arte de comandar. Ressalta a este respeito o seu fino trato, a serenidade com que enfrentava as situações adversas, a aplicação da solução certa em face do problema que se lhe deparava, a confiança que incutia nos homens que comandava, colocando-se ao lado destes. E, se necessário fosse, chamando a si funções que, longe de desprestigiarem a sua categoria ou de ofuscarem o brilho dos galões que trazia nos ombros, afirmaram-no, para todo o sempre, como baluarte da hierarquia do exemplo.

O Comandante Artur Lage consubstancia a nossa mais remota referência de bombeiro, em torno da qual muito cedo se estabeleceu uma especial empatia, o que motivou, ao longo dos anos, a reunião de diversa informação acerca da sua pessoa.

Confessamos, portanto, facto do qual já demos prova noutras circunstâncias, que somos seus fãs incondicionais - ontem, hoje, sempre!

Recordamos, nesta ocasião, dois grandes momentos de júbilo da vida do Comandante Artur Lage que tivemos a subida honra de presenciar, e que retemos nitidamente na memória: o acto de imposição do Crachá de Ouro da Liga dos Bombeiros Portugueses, por 50 anos de serviço qualificado, pelo então Presidente da República, General Ramalho Eanes, no decurso da sessão de encerramento do XXV Congresso Nacional dos Bombeiros Portugueses, realizado na Figueira da Foz, em 1982; e o desfile apeado e motorizado de encerramento do XXVII Congresso Nacional dos Bombeiros Portugueses, ocorrido em Cascais, no ano de 1986, com a participação de 2 mil bombeiros do país, cujo comando geral esteve a seu cargo, na qualidade de decano dos comandantes.

Da abordagem destes e de outros factos nos ocuparemos durante os próximos meses, recorrendo para o efeito à reprodução de fragmentos de textos, fotografias e demais curiosidades que espelham o nobre carácter do nosso homenageado numa trajectória de vida que se pautou, em permanência e gratuitidade, pela entrega aos outros. Porém, como humano que era, não deixou de ter os seus defeitos. Momentos houve em que foi incompreendido por uns e, até, injustiçado por outros, mas a sua forte têmpera soube sempre suplantar os momentos difíceis, mantendo a dignidade e o prestígio.

"Sou daqueles que não ligam importância aos ditos de homens ou mulheres, por saber, que quem se encontra só num lugar e destaque como o meu, não pode trabalhar à vontade de todos, mas sim da maneira que a sua inteligência e conhecimento lhe permitem" - afirmou, em determinada circunstância, marcando indubitavelmente a sua qualidade inata de grande líder.

Prestes a terminar esta apresentação, seja-nos permitido apontar aquele que, à luz da interpretação de diferentes factos, consideramos ter sido o seu maior defeito: não preparou, em suficiência, as gerações subsequentes, visando a garantia da sucessão no Comando, facto originário de uma realidade instável e complexa, de resto arrastada no tempo, principiada com a sua passagem ao antigo Quadro Honorário. Há que afirmá-lo, sem tibiezas, porque essa corresponde a uma verdade histórica. Tão verdade como o facto de Artur Lage - e sem desprimor pelos seus homólogos - ter sido, até hoje, o melhor Comandante de sempre dos Bombeiros Voluntários de Agualva-Cacém!


Luís Miguel Baptista